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sábado, 28 de maio de 2011

Saúde Entrevista – Paulo Amarante fala sobre saúde mental e reforma psiquiátrica

Mais uma entrevista com o Paulo Amarante sobre Reforma Psiquiátrica. Confiram! Fonte: Portal Minas Saúde
Data:20/05/2011
Autor:Wander Veroni
O escritor e médico psiquiatra Dr. Paulo Amarante, 58 anos, é mestre em Medicina Social (UERJ) e doutor em Ciências da Saúde (ENSP/Fiocruz) com estágio de doutorado em Trieste (Itália) e pós-doutorado em Imola (Itália). Ele é carioca, pesquisador titular e coordenador do laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, da Fiocruz, no Rio de Janeiro.
Um dos livros mais famosos de Paulo Amarante é "Loucos pela Vida: a Trajetória da Reforma Psiquiátrica", lançado pela Editora Fiocruz. A obra é o resultado de um estudo desenvolvido por pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Publica/Fiocruz e que abre caminho para a construção de outras possibilidades para as pessoas com sofrimento psíquico. Paulo também é autor e organizador de vários livros que abordam estudos sobre saúde mental e reforma psiquiátrica aqui no Brasil, como por exemplo, o livro "Psiquiatria Social e Reforma Psiquiátrica", que conta como foi este processo que levou várias instituições a trabalhar de forma mais humanizada os doentes mentais no Brasil.
Atualmente, ele lançou um novo livro, o “Saúde Mental e Atenção Psicossocial”, pela Editora Fiocruz ao preço de R$ 15. De acordo com o autor, a ideia desta coleção Temas em Saúde é publicar livros com temas de interesse geral, voltados para a população e não apenas os profissionais da área, com linguagem simples e preço acessível.
“O importante é que seja uma fonte de informação e esclarecimento sobre temas cruciais para a saúde da população. Desta forma, o livro aborda o porquê da necessidade de mudar o modelo assistencial psiquiátrico, acabando com os hospícios e substituindo-os por formas mais solidárias e eficientes de tratamento, ao mesmo tempo em que são formas que não segregam os sujeitos com transtorno mental, pelo contrário, trabalha no sentido de sua inclusão como cidadãos”, afirma o médico psiquiátrica. A convite da Equipe de Web Jornalismo do Portal Minas Saúde, Paulo fala com exclusividade sobre a luta anti-manicombial e os desafios do sistema de saúde de introduzir um atendimento convergente às propostas de humanização. Acompanhe a entrevista abaixo:
Portal Minas Saúde - Quando falamos em doença mental, muitas pessoas ainda fazem a ligação aos sanatórios. O processo de “des-hospitalização” ajudou a diminuir o preconceito?
A psiquiatria tradicional é que construiu esta imagem de que a pessoa com transtorno mental é louca, insana, insensata, perigosa, etc. Nós que compartilhamos de uma nova visão da psiquiatria precisamos mudar esta visão, demonstrando que não e assim, que é possível tratar as pessoas com outras bases, mais solidária e ética, sem excluí-la e sem ferir sua dignidade.
Portal Minas Saúde - A diminuição do número de leitos da saúde mental, no caso de pacientes mais graves ou que cumprem pena, ainda é uma questão muito discutida. O que pode ser feito?
É necessário investir em novos serviços, o que implica em investir também em novos profissionais, formar quadros com novas bases conceituais, científicas e éticas. Na prática estamos demonstrando que estas hipóteses são verdadeiras. Centenas de pessoas que viviam abandonadas, esquecidas, em manicômios, com observações de degeneração, sem possibilidades clínicas, e assim por diante, se tornaram cidadãos, artistas, militantes, moram em casas, passeiam, se divertem, vivem nas cidades, contrariando radicalmente as idéias que se tinha sobre elas.
Portal Minas Saúde - Estresse, ansiedade, depressão, bipolaridade, são algumas doenças mentais “comuns”, que o público leigo já possui algum tipo de familiaridade. No entanto, podemos perceber certa resistência ou até mesmo preconceito quanto ao tratamento. Na sua opinião, como mudar esse panorama? Hoje em dia, as pessoas podem ter mais acesso ao tratamento pelo SUS?
É preciso ter muito cuidado com esta posição mais ou menos naturalizada do crescimento destas “doenças mentais” na população. E é preciso inclusive desconfiar destas pesquisas. Uma importante pesquisadora dos EUA, Marcia Angell, em seu livro sobre a indústria farmacêutica (A verdade sobre os laboratórios farmacêuticos, Ed. Record) nos alerta de maneira muito série e fundamentada sobre este golpe da medicalização do social, e já se fala em invenção da doença para vender mais remédios (mongering deseases). De qualquer forma, as pessoas com necessidade de tratamentos têm mais acesso ao SUS, mas deveriam ter mais. O mercado dos planos de saúde tem aumentado muito e tem tomado espaços que deveriam ser do SUS.
Portal Minas Saúde - Você é autor e organizador de vários livros sobre saúde mental e reforma psiquiátrica. O que o motivou a escrever sobre isso?
É um tema muito importante. O que me motivou, principalmente, foi a necessidade de fundamentar, tanto no âmbito da ciência quanto no âmbito da filosofia, que a reforma psiquiátrica tinha princípios sólidos e que não se tratava “somente” de uma luta pela dignidade humana, o que não é muito pouco. O tema está em franco crescimento. Na Editora Fiocruz eu sou editor de uma coleção, que denominamos de Loucura & Civilização, que teve, nos últimos anos, três títulos na lista dos indicados ao Prêmio Jabuti. Na Revista Saúde em Debate, que agora completa 35 anos, da qual eu sou editor, este é um dos temas mais abordados pelos autores. A revista é de saúde como um todo!
Portal Minas Saúde - Para finalizar, nos conte qual livro publicado que mais gostou e qual teve (ou tem) uma repercussão positiva? Você se dedica muito a produção e a pesquisa sobre este tema? Conte-nos um pouco sobre a sua rotina de trabalho?
Eu gosto de muitos de meus livros, mas talvez o que tenha tido um maior impacto, por ter sido uma ferramenta de transformação na mão de muitos profissionais, de muitos atores militantes da reforma psiquiátrica, é o Loucos pela vida – a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. É um livro que eu lancei em 1994 e que teve várias reedições e reimpressões. Teve uma época que eu decidi não mais publicá-lo. Fiquei cinco anos com ele esgotado. Foi uma gritaria geral: recebi inúmeros emails e recados, além de pessoas que iam me ver em congressos, seminários, etc., que cobravam a reedição. Uns diziam, eu tenho a fotocópia, mas eu quero o livro.
No momento estamos finalizando um livro sobre as iniciativas culturais no âmbito da reforma psiquiátrica. Analisando como estas iniciativas passaram a ter uma importância no sentido das pessoas com transtorno mental falarem de suas experiências e produzirem novos sentidos para elas, e de como estas iniciativas contribuem para mudar a cultura, o estigma, a discriminação para com elas. Não é a toa que nosso mundo cultural de uns anos prá cá está repleto de bandas como Harmonia Enlouquece, Sistema Nervoso Alterado, Trem Tan Tan, ou TV’s como TV Pinel, Rede Parabolinóica, blocos de carnaval como Ta Pirando Pirado Pirou, Loucura Suburbana, ConsPirados, LokoMotiva, e por aí em diante...

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Saúde Mental: mudanças e expectativas para 2011

Olá pessoal, publicamos aqui o Informe ENSP, em entrevista com Paulo Amarante.


Saúde Mental: mudanças e novas perspectivas para 2011 - 03/12/010

Informe ENSP

A garantia de um novo edital do prêmio Loucos pela Diversidade, do Ministério da Cultura, para 2011, a realização da conferência brasileira de saúde mental, a discussão de uma nova linha do movimento da reforma psiquiátrica a favor da volta dos manicômios e a realização do já tradicional curso de especialização em Saúde Mental e Atenção Psicossocial foram alguns dos assuntos debatidos com o coordenador do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial (Laps/ENSP), Paulo Duarte Amarante, em entrevista ao Informe ENSP. Confira, abaixo: 

Informe ENSP: Como foi o ano de 2010 para a saúde mental? 

Paulo Amarante:O ano de 2010 foi muito importante para a saúde mental no âmbito nacional, internacional e, em especial, para nós da ENSP. Foi assinado um novo convênio de cooperação entre a Secretaria de Identidade e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura (SID/MinC) e a Fiocruz para a realização do novo edital do prêmio Loucos pela Diversidade para 2011. Isso mostra que o tema está sendo tratado como política de Estado e dá continuidade a uma proposta que visa estimular a produção cultural na área da saúde mental. O novo edital foi anunciado pelo ministro da Cultura, Juca Ferreira, durante a última reunião do ano do Conselho Nacional de Cultura. Para ele, essa é uma política prioritária para o Ministério. Teremos um montante de R$ 1,1 milhão. 

Este ano, também aconteceu o IX Congresso Internacional de Saúde Mental e Direitos Humanos, que o Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial (Laps/ENSP/Fiocruz) participa como coorganizador desde a primeira edição, em 2002, com a Universidade Popular das Madres da Plaza de Mayo. O encontro é muito importante, e em 2010 contou com a participação de mais de 5 mil pessoas, com convidados de vários países. Durante o congresso, fizemos uma manifestação o pela aprovação da lei argentina de reforma psiquiátrica e promovemos um abaixo-assinado expressivo. Eu também assinei dentre as pessoas do Brasil, e, essa semana, tivemos mais essa conquista mundial. A lei foi aprovada pelo Senado Federal Argentino. É um avanço, e certamente esse ganho teve a influência do nosso país, pois o Brasil vem sendo uma referência nesse campo para a Argentina. O movimento também se reflete na América Latina como um todo, na medida em que vai ajudar a fomentar o debate nos países do Mercosul. 

Foi realizada, ainda, a IX Conferência Nacional de Saúde Mental - intersetorial, uma vez que não foi voltada exclusivamente para o setor saúde. Na abertura, contamos com uma conferência do secretário Especial de Direitos Humanos, o ministro Paulo Vannuchi, e também tivemos uma expressiva participação da cultura, por meio da SID/MinC e do Ministério da Trabalho. Tivemos uma programação elaborada com a participação da ENSP e eu, como membro da comissão nacional organizadora da conferência, atuei no campo da cultura, pensando em temas, mesas, na questão da diversidade e da cultura-arte no campo da saúde mental, e na programação cultural que conseguimos levar, com o apoio do Ministério da Cultura, como o Grupo Harmonia Enlouquece, o Sistema Nervoso Alterado, entre outros. Também tivemos grupos de teatro como o Tá pirando, pirado, pirou, o Bloco Cons-pirados, de Ouro Preto, o Bloco de carnaval Bibi-Tantan, de São Paulo. 

Informe ENSP: Que pontos você destaca sobre essa conferência de 2010? 

Paulo Amarante:A conferência teve muitos pontos positivos, pois conseguimos, de fato, um debate inter e multissetorial. Por outro lado, ainda carregou um caráter estatal, governamental e com pouca participação da sociedade, do controle social e dos usuários. Teve caráter muito "congressual", com debates centrados em palestras, conferências e mesas. Mas a questão é que a experiência é um processo político de construção coletiva dos princípios das política! s públicas. Para mim, deveriam existir muito mais momentos de troca, de discussão de princípios. 

Outra situação lamentável é que a conferência aconteceu no último ano de gestão do governo federal. O momento ideal é o primeiro ano de gestão, pois o novo governo poderá levar as propostas para o âmbito do Estado. Embora o novo governo seja do mesmo partido e linha de governo, nada garante que o próximo gestor tenha de adotar o que ficou decidido ou que foi proposto na outra gestão. O ideal é construir junto com os profissionais que estão assumindo o Ministério. 

Ainda em 2010, trouxemos o grupo teatral Accademia della Follia, que nasceu em um hospital psiquiátrico de Trieste, na Itália, com o espetáculoExtravagância, para uma turnê no Brasil. Eles já se apresentaram no Rio de Janeiro, mas ainda têm exibições agendadas para Salvador, Fortaleza,  e em Quixadá, no Ceará. Com essas iniciativas de atividades culturais não trazemos mais apenas o psiquiatra, o profissional de saúde mental da Itália, mas o usuário dos serviços de saúde e outras formas de expressão da reforma psiquiátrica. 

No segundo semestre de 2010 também tivemos o II Congresso Brasileiro de Saúde Mental da Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme). Uma associação importante que veio trazer para o âmbito da saúde mental a trans e interdisciplinaridade e trans e intersetorialidade, pois além de profissionais de diversas frentes também podem participar usuários, familiares, e outros. Essas discussões propiciam uma proposta mais ampla de reforma psiquiátrica, que não é só reforma de serviço. 

Informe ENSP: E sobre a nova linha do movimento da reforma psiquiátrica, que defende a volta dos manicômios? 

Paulo Amarante: Agora, temos de enfrentar mais esse processo de contrarreforma, que é um processo muito bem situado nos empresários dos hospitais psiquiátricos. Conseguimos fechar, ao longo desses anos, mais de 40 mil leitos de hospitais psiquiátricos absolutamente precários, perversos no atendimento, que tinham baixo nível de alimentação, de tratamento, de isolamento, falta de liberdade, de direitos etc. Fechamos muitos e estamos acabando com essa cultura de que ‘louco tem de ficar internado’. Aos poucos, estamos criando a rede substitutiva, fomentando outras expressões. Não temos apenas de mudar os serviços; precisamos criar outras possibilidades por meio da cultura, do trabalho, da educação, da geração de renda e outros. 

Essa resistência contra o fechamento vem predominantemente por parte de empresários e dos setores da academia conservadora, que, não por mera coincidência, são também os empresários ou estão, de alguma forma, vinculados aos interesses empresarias dessa área. O perigo é que muitos familiares acreditam ingenuamente neles, que dizem que o hospital vai acabar e os pacientes ficarão abandonados, e esse não é o nosso propósito. 

Informe ENSP: Além do edital do Loucos pela Diversidade, já existem novos projetos para 2011? 

Paulo Amarante: Estamos com uma grande perspectiva para o prêmio de 2011 do Loucos pela Diversidade, pois, no próximo ano, terá um novo foco, em centros culturais que desenvolvem trabalhos com pessoas com sofrimento psíquico. Além disso, temos a 28ª edição do curso de saúde mental, que começou oficialmente essa semana no Rio de Janeiro, em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul e no Paraná. Esperamos que, no ano que vem, consigamos iniciar o curso no Amazonas e no Estado de Sergipe. Já estamos em negociação. 

Este mês, recebi um convite que me deixou especialmente feliz. Foi resultado de um projeto que realizei em 2005, na ENSP, sobre o papel do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, do Distrito Federal, Pernambuco, Bahia entre outros, na reforma psiquiátrica, no âmbito do Programa Estratégico de Pesquisa em Saúde da Fiocruz (Papes IV). Na época, apontei que o Ministério Público tinha uma atuação irrelevante nessa área. Eles recebiam as comunicações de internação de pacientes e apenas arquivavam, sem analisá-las, já que o artigo oitavo da Lei 10.216 determina que! toda internação involuntária deve ser comunicada ao Ministério Público. Os profissionais da saúde mental de lá diziam que eles não tinham de julgar o diagnóstico do psiquiatra. E nós argumentamos que as condições pelas quais as pessoas foram internadas devem, sim, ser analisadas, pois o tratamento indicado pode não ser o mais indicado. 

Depois da minha pesquisa, eles desenvolveram o módulo de saúde mental, que se chama MSM, totalmente informatizado. Através dessa ferramenta, será possível acompanhar não só as pessoas com internação involuntária, mas também voluntária, internação compulsória, acompanhar os hospitais, acompanhar se a pessoa recebe um benefício, se alguém recebe por ela, se ela tem um tutor, se o tutor presta contas, se o paciente está há muito tempo internado, se foi internado muitas vezes. Esse mapa de cada paciente vai acenar para o promotor público se há um problema no tratamento ou na resposta institucional, falta de recursos institucionais o! u não hospitalares para que ela seja tratada regularmente, entre outros. 

Essa é uma grande inovação, pois com o MSM será possível identificar essas questões específicas que passam despercebidas em um processo não tão transparente. Com esse meu trabalho, que tem a participação de diversos outros pesquisadores, demos início ao Observatório de Saúde Mental e de Direitos Humanos, que nunca conseguimos tornar um Observatório permanente. Mas esse trabalho construiu bases que foram colocadas e disponibilizadas aos Ministérios Públicos Estaduais e à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, que possui uma comissão de saúde mental e de direitos humanos.
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